A beleza e harmonia da juventude é algo admirável e até mesmo desejado por muitos que já não partilham mais de tamanha graça. Dizem que a juventude acaba, responsabilidades chegam e muitos amigos se vão pra dar lugar à vida nova que teremos pela frente; mas qual o real preço disso tudo? Vale a pena? A partir desse ponto, podemos ver ‘‘Entre Nós’’, filme de Paulo Morelli, que conta a história de sete amigos, artistas e escritores, e seus desafios de vida em sua passagem pela juventude plena e a vida adulta.
O filme está nitidamente divido em duas partes. Na primeira conhecemos Felipe (Caio Blat), Silvana (Maria Ribeiro) Lúcia (Carolina Dieckmann), Gus (Paulo Vilhena), Cazé (Júlio Andrade), Drica (Martha Nowill) e Rafa (Lee Taylor), sete jovens sonhadores, animados e altamente criativos vivendo uma vida alegre, sem grandes preocupações e grandes ideias na cabeça; E é a partir de uma delas que a estória se desenrola. Celebrando sua amizade em uma viagem para uma casa de campo, os amigos decidem então escrever cartas para si mesmos, colocar em uma caixa e só reabrir dali há dez anos, numa espécie de cápsula do tempo. O dia porém acaba ficando marcado não por esse momento de diversão e sintonia, mas sim por um acidente envolvendo Felipe e Rafa, que tem como resultado a morte de Rafa.
Partimos então para a segunda (e melhor) parte do longa. Dez anos após o ocorrido, o grupo de amigos se reencontra na velha casa do campo para então abrir a tal caixa e ter o contato com o passado. Como esperado, não só eles como as coisas mudaram muito desde a última vez que estiveram todos juntos; Lúcia, que antes namorava Gus, agora está casada com Felipe, que agora tem seu livro publicado e carrega uma certa fama literária pelo feito, Drica e Cazé estão casados, mas ainda sem os tão sonhados filhos de Drica, Silvana mantém em sua vida experiências vividas fora do país, enquanto Gus acaba se tornando uma pessoa problemática, desacreditada de si mesmo e que ainda mantém, mesmo que em silêncio, um sentimento grande por Lúcia. Mas o que fato move essa segunda parte é o foco que foi levado. A história toma um clima de suspense, evidenciando segredos e problemas envolvendo os seis amigos, enquanto mostra o que uma ferida antiga pode fazer com um grupo tão unido de amigos.
Felipe foi o único a ler o romance quase finalizado por Rafa dez anos antes, e por isso carrega junto de si uma promessa literária enorme, fazendo com que após um almoço, em que os amigos pedem uma ideia do que Rafa havia escrito, um segredo sobre a morte do mesmo comece a vir à tona, deixando assim o clima bem mais tenso e interessante. Caio Blat soube explorar muito bem, com certa delicadeza e importância, a angustia e a dor que Felipe carregou durante todo esse tempo por suas atitudes, dando vida à uma pessoa mais introspectiva, um tanto pensativa demais acerca de tudo e bastante pessimista sobre o que pode vir a seguir. Mas não é só isso; Morelli soube mostrar muito mais do que o foco principal, deixou espaço também para explorar a intimidade e imperfeição da vida de cada um dos amigos e de suas frustrações ao longo desse anos todos. É possível observar a necessidade de mudança na vida de todos de uma forma gritante, ao mesmo tempo que contextualiza toda a história com seu tempo, envolvendo política, literatura e música, tornando toda a produção algo mais íntimo de quem vê e viveu tais épocas.
O momento em que as cartas são abertas deixam o filme mais belo, angustiante e melancólico; Confissões são feitas, pensamentos filosóficos e futuros são postos pra fora e verdades são ditas. E é no meio de tudo isso que podemos observar a fragilidade um tanto pessoal de Felipe, o amor tão emocionante de Gus, o quão racional e imoral é o pensamento de Cazé e tamanha é a paixão e saudade de Silvana.
Dizer que os atores apenas cumpriram seus papeis seria de tamanha hipocrisia que não seria digno. Não só Caio Blat, como todos os outros atores e atrizes puderam e tiveram espaço para desenvolver cada personagem com perfeição, carisma e leveza, deixando o filme bonito e dando o toque sentimental que deveria ter. Sem falar na beleza do cenário e na emocionante trilha sonora, que faz jus ao espaço-tempo que o filme acontece e expressa de uma forma brilhante os momentos e sentimentos explorados no longa.
“Entre Nós” é um filme único, diferente de tudo que o cinema nacional está acostumado a fazer. Tem um começo arrastado e sem grandes explicações, deixa certas pontas soltas ao longo, mas não deixa a ideia se perder e aos poucos acha seu caminho, levando à um final belíssimo, cheio de sentimentos reprimidos e jamais esquecidos, além de se deixar perguntar qual o preço de uma lembrança e a dor que ela pode causar.








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